Hoje celebramos 26 anos da inauguração da ponte rodoferroviária Vuolo-Rollemberg e, nesse contexto, o Costa Leste News publica entrevista com Marcos Vinicios de Araujo Vieira, diplomata de carreira, que nos fala um pouco sobre a história desse grande empreendimento da engenharia moderna.
A ponte rodoferroviária Vuolo-Rollemberg foi inaugurada pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso em 29 de maio de 1998. De onde veio a ideia da ponte?
A ideia da ponte é mais antiga do que se costuma imaginar. Falava-se nela já no final do século XIX. Por volta de 1880, um engenheiro paulista chamado Olavo Hummel vistoriou a divisa de Mato Grosso e São Paulo, em missão de reconhecimento da Estrada Boiadeira do Taboado, entre São José do Rio Preto (SP) e Santana do Paranaíba (MT). Na oportunidade, conheceu as instalações do porto Taboado e identificou, a dois quilômetros a montante, um lugar favorável para a construção de uma ponte sobre o rio Paraná. Curiosamente, a indicação coincide com o ponto onde seria construída, um século depois, a ponte rodoferroviária Rollemberg-Vuolo.
Por que o engenheiro Hummel via a necessidade de uma ponte sobre o rio Paraná já naquela época?
Por uma questão econômica. Naquela época, pelo porto Taboado, havia um trânsito intenso de boiadas que atravessavam o rio Paraná a nado. Eram boiadas que vinham de fazendas do Mato Grosso, Minas e Goiás e se dirigiam a Jaboticabal, o maior mercado de bovinos da época. A ponte era vista então como meio de assegurar o trânsito rápido e desimpedido de animais.
Também muito se fala que o escritor Euclides da Cunha defendeu a construção da ponte. Como é essa história?
De fato, Euclides defendeu a construção da ponte, o que mostra que tinha visão arrojada das coisas. Ele era engenheiro da Superintendência de Obras Públicas de São Paulo e, por volta do ano de 1900, foi encarregado de duas missões: avaliar as condições da Estrada Boiadeira do Taboado e verificar a possibilidade de construção de uma ponte sobre o rio Grande, como fora sugerida pelo engenheiro Hummel. Os registros de sua missão estão no livro “Contrastes e Confrontos”, publicado em 1901. Além da melhoria da estrada do Taboado, Euclides propôs a construção da ponte porque estava convencido de que a ponte era uma necessidade econômica e geopolítica. Seria um vetor de integração de Mato Grosso com o restante do país. Assim ele escreveu:
“De fato, percorridos os 435 quilômetros que vão de Jaboticabal à margem direita do Paraná, fronteira ao Taboado, mercê de uma ponte de 880 metros sobre o grande rio, a única obra de arte dispendiosa a executar, a estrada se desdobrará, a partir de Santa Ana, pelo vale do Aporé (…) Quando isto suceder – dando-nos mesmo às diligências, numa marcha diária de dez horas, uma velocidade média de doze quilômetros, a travessia de Jaboticabal a Cuiabá será feita, folgadamente, em dez dias – precisamente um terço, portanto, do que hoje se gasta na volta de quinhentas léguas pelo Prata. (…) E se isto não acontecer – então, parafraseando uma frase célebre, é que decididamente nos faltam ‘um grande engenheiro, um grande ministro e um grande chefe de Estado’, para a realização das grandes obras”.
Quer dizer que a campanha para a construção da ponte sobre o Rio Paraná já havia começado no começo do século XX. Quando ela ganhou força?
A campanha só ganhou força política na década de 1970, quando vários prefeitos do noroeste paulista se articularam para fazer gestões junto ao governo federal. Argumentavam que a construção da ponte favoreceria as exportações de grãos, ao diminuir a distância entre o porto de Santos e Porto Velho, e impulsionaria o desenvolvimento econômico regional. Um projeto para a construção da ponte chegou a ser encomendado pelo governo federal em 1979, mas a iniciativa só saiu do papel em 1991 após campanha no Congresso Nacional liderada pelo senador Vicente Emilio Vuolo (MT) e os deputados Roberto Rollemberg (SP) e Edinho Araujo (SP).
Como foi a construção da ponte? Houve dificuldades?
A empresa Constran venceu a licitação pública para a construção da ponte. Iniciadas em 1991, as obras foram paralisadas em 1995, em consequência de restrições orçamentárias. Em resposta à paralisação, o ex-senador Vicente Emilio Vuolo liderou protestos e fez publicar um artigo com o título “Paralisar a Ponte Rodoferroviária é um Crime Doloso”. Pouco tempo depois, a construção foi restabelecida e a ponte, inaugurada pelo presidente Fernando Henrique Cardoso em 29 de maio de 1998.
Uma obra de arte da engenharia moderna, a ponte rodoferroviária é o grande símbolo de um projeto de integração regional, idealizado pelos engenheiros Hummel e Euclides da Cunha no final do século XIX e sonhado por gerações de pessoas que viveram em nossa região.
Marcos Vinicios de Araujo Vieira, de Aparecida do Taboado, é diplomata de carreira
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