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Bolsonaro fez sua primeira prestação de contas, e o resultado é deprimente

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Na última quarta-feira, Bolsonaro anunciou que passará a fazer “lives” semanais para prestar contas ao povo brasileiro. Tudo indica que elas serão a principal forma de comunicação do presidente. Sem jornalistas para incomodá-lo, Bolsonaro fica mais à vontade para prestar contas com o seu jeitinho peculiar: distorcendo e fabricando fatos.

Vestindo uma camiseta da Nike como se fosse um youtuber patrocinado, Bolsonaro mostrou poder de síntese ao enfileirar um sem número de mentiras em pouco mais de 15 minutos. Vejamos quais foram as principais lorotas e insanidades que Jair resolveu dividir com o povo nessa primeira live de prestação de contas.

O presidente começou o vídeo falando sobre a “indústria da multa” do Ibama. Contou a história de um pobre pescador que entrou com seu barquinho em uma área proibida para pesca e foi multado em R$ 170 mil. Uma história difícil de engolir, ainda mais vinda de alguém que nutre rancor pelo Ibama desde que foi multado justamente por pescar em área irregular.

Voltemos para a prestação de contas do presidente. O próximo assunto abordado no vídeo foi o Acordo de Paris, do qual ele é um profundo desconhecedor.

“Olha, as informações que eu tenho, logicamente não são todas ainda, podem estar um pouco imprecisas, mas, entre as exigências do Acordo de Paris, se exige que o Brasil faça um reflorestamento de uma área enorme, algumas vezes o estado do Rio de Janeiro. Nós não temos como cumprir uma exigência dessa. Se assina, porque é bonito, até porque essa exigência é para cumprir em 2030 — então quem for presidente em 2030 que se vire — mas as sanções vêm aí. Em um primeiro momento, sanção política; em um segundo segundo momento, sanção econômica; em um terceiro momento, sanção de força. Nós não podemos colocar em risco a nossa soberania nacional, parte do nosso território”

As informações fornecidas estão longe de serem “imprecisas”. São falsas mesmo. O Acordo de Paris não impõe exigência nenhuma aos países signatários, o que mostra que o presidente não faz a mínima ideia do que ele representa. A ignorância sobre o tema ficou clara no começo do mês, quando reclamou do compromisso do Brasil com o chamado “Corredor Triplo A”, algo que simplesmente não tem nenhuma relação com o Acordo de Paris.

Cada país estabelece suas próprias metas de acordo com suas condições sociais e econômicas. Elas não são definidas nem impostas por ninguém. Em 2016, o Brasil enviou documento a ONU apresentando metas propostas pelo governo que foram aprovadas pelo Congresso Nacional — inclusive por unanimidade na Câmara, da qual Bolsonaro fazia parte.

Bolsonaro disse ser “contra essa história de cota migratória para o Brasil”, algo que nunca sequer foi cogitado pelo pacto. Além das mentiras, Bolsonaro aproveitou para atiçar a xenofobia ao dizer que não é admissível que “certo tipo de gente” venha para “querer se casar” com nossas crianças — uma paranoia que não faz o menor sentido, até porque o casamento com menores é proibido por lei, mas que tem a eficácia de manter a chama do medo acesa.

Aí chegou a hora dos povos indígenas de Roraima serem alvo dos devaneios de Jair.

“Roraima é o pedaço de terra mais rico do Brasil. Se eu fosse rei de Roraima — e com tecnologia — em 20 anos o estado teria uma economia semelhante à do Japão. Lá tem tudo. Por isso, a pressão internacional para demarcar cada vez mais terras indígenas”

“Eu quero que o índio seja integrado à sociedade (…) Têm índios que falam nossa língua muito bem, que têm nossos costumes. Isso que queremos, não queremos que atrapalhem o desenvolvimento da nação”

O estado de Roraima tem proporcionalmente a maior população indígena do país. Há tribos isoladas na Amazônia que nunca tiveram contato — e nem querem ter — com o homem branco ou outras tribos indígenas. O presidente alega que um solo rico como o de Roraima não pode deixar de ser explorado em nome da proteção dos indígenas.

“Se algo estiver errado, que seja comigo, com meu filho, com o Queiroz, que paguemos a conta desse erro, que nós não podemos comungar com o erro de ninguém. (…) Dói no coração da gente? Dói. O que temos de mais firme é o combate à corrupção.”

Perceba que, além de chamar desvio de dinheiro público de “erro”, o presidente coloca sua honestidade na condicional. Jair parece não ter certeza da sua inocência e vai aguardar o fim das investigações. Fosse Rei de Roraima, certamente não precisaria passar por essa dor no coração.

O assunto, aliás, parece ser uma obsessão antiga de Jair. Depois que foi autuado pelo órgão em 2012, o então deputado federal entrou com um mandado de segurança na justiça para que pudesse pescar em uma área em Angra dos Reis onde é proibida qualquer tipo de intervenção humana. À época, os pobres pescadores da região também foram usados como pretexto. Bolsonaro alegou que entrou na justiça para garantir o direito deles, o que é mentira. O mandado de segurança é um instrumento jurídico de interesse particular. Somente ele se beneficiaria, enquanto os pobres pescadores continuariam sem permissão.

A verdade é que o presidente despreza todo o trabalho feito em defesa do meio ambiente no Brasil. Quando soube que entidades ambientais criticaram a escolha de Ricardo Salles para o ministério do Meio Ambiente, falou para Onyx: “acho que acertamos”. O futuro ministro, aliás, afirmou que Bolsonaro não foi multado porque pescava em área irregular, mas porque foi flagrado com uma vara de pesca na mão em área irregular. Segundo Salles, a aplicação da multa seria uma prova de que a “questão ideológica permeia a atuação do Ibama”. A visão do ministro sobre meio ambiente é essencialmente ideológica, como fica claro nesse tweet recente do Endireita Brasil, movimento do qual ele é o presidente.

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